Parte da população brasileira, em especial aqueles que lutaram nos últimos anos contra a cleptocracia (expressa pela corrupção sistêmica que assola drasticamente a nação), aguarda com muita preocupação o desdobramento do voto do ministro Gilmar Mendes (STF) com relação ao habeas corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Lula, que pede a nulidade das suas condenações, sob alegação de suspeição do ex-juiz Sérgio Moro.
Muitos não
perceberam que quem está na verdadeiramente na “berlinda” não é Sérgio Moro,
mas toda a Força Tarefa da Operação Lava Jato, que apresentou centenas de
denúncias e levou a condenação mais de 200 criminosos que desviaram bilhões de reais
em recursos públicos. Se Gilmar Mendes deferir a suspeição de Sérgio Moro irá, ao
mesmo tempo, afirmar que as dezenas de pessoas envolvidas nas investigações, nas
apurações das denúncias e nos julgamentos, atuaram movidas por uma parcialidade
nada republicana. Ou seja, condenar Sérgio Moro é condenar todos os policiais
federais, procuradores do Ministério Público Federal, procuradores da
república, magistrados, desembargadores e ministros (STJ) que investigaram, instruíram,
acusaram, julgaram e condenaram os réus em várias instâncias.
É isso mesmo.
O que está em julgamento não é a simples nulidade do processo no qual o Lula foi
condenado. É toda uma institucionalidade que reagiu a cleptocracia sistêmica brasileira
e que disse BASTA DE CORRUPÇÃO. Uma institucionalidade que deu a esperança para
milhões de que o Brasil poderia mudar a sua trajetória de subdesenvolvimento,
sempre ancorara em interesses nada republicanos de determinados grupos
políticos e econômicos; que, em conluio, saquearam, e continuam saqueando, a
nação brasileira.
Lamento
profundamente que alguns tenham festejado a decisão recente do ministro Edson
Fachin (STF) – alguns inclusive com certo nível de compreensão de fatos
públicos, posto devidamente letrados. Ver determinadas manifestações, de quem
foi e continua sendo permissivo com a corrupção, ou se comporta apenas como um “inocente
útil” (que se permite ser ideologicamente manipulado), me causou profundo
desgosto, tristeza e náuseas.
Para estes, o
projeto de poder de seus grupos políticos e de seus partidos está sempre acima
dos interesses mais gerais da sociedade. Projeto de sociedade? Jamais! O que
conta sempre é, maquiavelicamente, os seus projetos de poder, valendo para isso
qualquer tipo de prática, mecanismo ou aliança, ignorando-se a ética, a
civilidade, a res pública e a probidade.
Ao festejarem
a anulação da condenação de um irrefragável condenado, com mais de um milhar em
provas acusatórias, dão um “murro na cara” do cidadão honesto, probo e ético. Claramente
não se importam com a corrupção, desde que o seu grupo político esteja no
poder. Pelo contrário, flertam com a corrupção, pois a mesma faz parte de um
mecanismo que não só os conduziu, mas também estabelece as bases para a sua recondução
e perpetuação no poder, consolidando uma “fétida república das ratazanas”.
Neste jogo
político, marcado pelos nossos “ismos” do subdesenvolvimento e do atraso
(personalismo, individualismo, populismo, patrimonialismo...), promovem atos de
culto e idolatria a personagens claramente destituídos de caráter e valores.
Constroem, para isso, num jogo ideológico eivado de uma retórica, com narrativas
falseadas que produzem em muitos o mesmo encanto que levou os ratos ao suicídio
no famoso conto dos irmãos Grimm, o Flautista de Hamelin.
É nesse
contexto que determinar a suspeição de Sérgio Moro não é somente “libertar” o Lula.
É declarar a nulidade de atos jurídicos convalidados por dezenas de magistrados
nas três instâncias judiciais (a condenação de Lula por Sérgio Moro foi
convalidada por juízes da primeira instância, desembargadores do TRF, ministros
do STJ e, inclusive, ministros do STF).
É declarar a suspeição e nulidade de centenas de condenações, num “trem da alegria” da cleptocracia brasileira. Uma declaração pública de que o crime de corrução compensa no Brasil porque as instituições republicanas do país são, não somente coniventes, mas, inclusive, cúmplices.
É chamar quem lutou contra a corrupção nos últimos anos, foi para a rua e fez a sua parte de otários. Desculpem-me pela forte afirmação com que termino esta reflexão. Mas este é o único sentimento que tenho pelo momento, um sentimento de que somos todos otários!
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