O dia 13 de setembro é uma data fatídica para a sociedade paraense. Há 20 anos, entrava em vigor a Lei Complementar 87/96, conhecida correntemente como Lei Kandir, que passou a desonerar da cobrança de ICMS as exportações de bens primários e semielaborados e a regulamentar a “ilógica lógica” de cobrança do ICMS de energia no estado de consumo. De uma vez só, o estado do Pará foi duplamente golpeado. E se isso não basta-se, o anexo da Lei, que deveria ordenar as compensações financeiras pelas perdas aos estados exportadores, até hoje não foi regulamentado.
Tentando compreender os impactos desta legislação no estado, em conjunto com duas outras autoras (Tatiane Vianna da Silva e Elizabeth Dias), publicamos em 2015 o livro “A Lei Kandir e o Estado do Pará: Inconstitucionalidades, Perdas e Impactos na Capacidade de Promoção de Políticas Públicas”, destacando o montante acumulado das perdas até 2014 (R$ 27,6 bilhões); que os municípios do estado também são fortemente penalizados, apresentando, inclusive, o cálculo das perdas para cada município; além de cinco pontos de inconstitucionalidade que podem ser alvos de questionamento judicial.
Com o objetivo de instrumentalizar a sociedade paraense, a Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa), entidade da qual sou presidente, lançou, no primeiro semestre de 2016, a Nota Técnica “Estimativas das Perdas de Arrecadação do ICMS de Energia Elétrica no Estado do Pará (2004 – 2014)”, tentando contabilizar as perdas reais de arrecadação que o estado vem logrando com este mecanismo de inversão tributária. Em apenas 10 anos, o Pará logrou uma considerável perda de R$ 21 bilhões com a energia aqui gerada e consumida em outros estados, restando para o estado apenas o ônus de mitigação dos impactos sociais e ambientais dos grandes empreendimentos.
Com o objetivo de complementar o assunto, a Fapespa elaborou a Nota Técnica “Estimativa das Perdas de Arrecadação dos Estados com as Desonerações nas Exportações da Lei Kandir (1997 – 2015)”, que será lançada no próximo dia 20 de setembro, em um evento alusivo aos 20 anos da legislação, organizado conjuntamente pela OAB/ESA, Corecon-PA e Fapespa.
Inúmeras informações serão compartilhadas por meio desta Nota Técnica. Contudo, a que mais chama atenção é o montante acumulado das perdas até o mês de dezembro de 2015. Nestes vinte anos de Lei Kandir, o Pará deixou de arrecadar em ICMS, em um montante atualizado monetariamente, a quantia de R$ 44,168 bilhões. Somente no ano de 2015, a perda do estado foi de R$ 3,969 bilhões, cerca de três vezes a capacidade anual de investimento do governo do estado. O tamanho da perda, excluindo-se o montante da energia gerada no estado e tributada no local de consumo, representou, no período de 2010 a 2015, uma média anual equivalente a 29,8% da Receita Corrente do poder público estadual.
Não tenho dúvidas de que a Lei Kandir está na raiz do esgarçamento do arranjo federativo brasileiro, ao mesmo tempo em que a superação da nossa condição de subdesenvolvimento, que perpassa pela construção de uma sociedade mais justa, inclusiva e igualitária, dependerá cabalmente da revisão destas distorções federativas, que acabam por consagrar o Pará como mero “almoxarifado” do desenvolvimento alheio. Mas, para isso, é fundamental o envolvimento de todo cidadão paraense em um movimento que consiga colocar de lado cores e bandeiras político-partidárias, destacando os interesses do estado dentro de um projeto mais amplo de sociedade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.