Economista aponta consequências prejudiciais na divisão do Estado, que será decidida no plebiscito marcado para dezembro
Quando o assunto é a eventual divisão do Pará, as projeções científicas do professor da Universidade Católica de Brasília (UCB) e técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Rogerio Boueri Miranda, 45, prometem levantar ainda muita poeira em Carajás e Tapajós, as regiões no foco central do plebiscito marcado para 11 dezembro. Seus números já correram o País e tiveram a atenção das mais diversas mídias.
Parte de um estudo criterioso levantado em todo o Brasil entre 2007 e 2008, os dados do economista – que tem mestrado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV e doutorado na Universidade de Maryland (EUA) – apontam para a inviabilidade das novas unidades da federação. Ele promete divulgar outras contas, desta vez sobre a área fiscal, cujo resultado deve embalar mais a campanha do “não”.
“Podem ser outras consequências (negativas)”, prevê. Rogério Boueri bate de frente com os separatistas e colegas de ramo, como o economista Célio Silva, que vem divulgando cálculos sobre a autonomia de Carajás, e Evaldo Viana, analista tributário da Receita Federal que referenda a emancipação de Tapajós. Para ele, as pesquisas estão equivocadas ao preconizar fôlego próprio dos dois Estados.
Caso virem realidade, a estimativa de Boueri é que a União e o Pará bancarão o ônus do desmembramento com um rombo nos cofres públicos. Ao ter analisado pedidos para o surgimento de cerca de 20 Estados, o técnico do Ipea informou que percebeu a chance de viabilidade apenas em um caso, referente ao triângulo mineiro. Leia abaixo os principais trechos da entrevista exclusiva concedida na semana passada ao jornalista J.R. Rodrigues para o site do deputado Márcio Miranda (DEM), líder do governo na Assembleia Legislativa.
Apesar do conhecido desejo de grande parte das populações de Carajás e Tapajós pela emancipação, o senhor acha que o plebiscito é uma decisão precipitada, sem que haja um estudo amplo envolvendo todas as esferas de governo e outros segmentos representativos e técnicos sobre a viabilidade ou não dos dois Estados?
Rogerio Boueri – Acho que sim, pois não houve um exame detalhado de como ficaria a situação dos outros Estados da Federação, com respeito ao Fundo de Participação dos Estados, o FPE, por exemplo, e muito menos de como ficaria a situação de remanescente do Pará caso se efetive a divisão.
Em caso de divisão e a partir do que mostram algumas projeções ou pesquisas como a que o senhor desenvolveu, que consequências mais danosas poderiam ocorrer nas áreas social, econômica e até cultural a curto, médio e longo prazo, já que se trata de um Estado com uma identidade e realidades muito particulares?
RB – Acho que para as populações do Tapajós e de Carajás a situação poderia melhorar, mas a um custo muito alto para o resto do País e mais alto ainda para o Estado do Pará.
O governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), disse que teme o dia seguinte à votação. Ele se referia ao possível surgimento de algum sentimento de animosidade. Como apagar esse fogo antes que se alastre?
RB – Acho que o governo paraense deveria repensar a sua política de gastos, procurando fazer justiça às populações daquelas regiões. Muito do fulgor separatista vem de uma divisão desigual dos recursos estaduais.
Vendo o outro lado da moeda: o senhor conhece algum levantamento seguro acerca da possibilidade de os dois pretensos Estados darem certo? Acaso as razões alegadas não seriam mais fortes que a do pessoal contra a divisão?
RB – Acho que o estudo do senhor Célio Silva muito bem feito, mas peca quanto à projeção de gastos do potencial Estado de Carajás, subestimando-as. Já o estudo do senhor Evaldo Viana sobre o potencial Estado de Tapajós é completamente irrealista. Ele prevê, por exemplo, que o Tapajós receberia cerca de R$ 2,5 bilhões a título de FPE, o que é mais que o Estado do Pará como um todo recebeu em 2010 (R$ 2,3 bilhões), não tem cabimento. Em suma, acho que esses dois novos Estados só se sustentarão com injeção maciça de recursos federais.
Quais os pontos principais de seu estudo anterior sobre o separatismo e que tiveram grande repercussão nacional?
RB – O principal ponto é que quando você cria um Estado novo, você amplia o gasto público brasileiro em R$ 1 bilhão. Isso porque a criação de um novo Estado implica a implementação dos três poderes em nível estadual, duplicando estruturas existentes.
Quais são as chances de o senhor estar equivocado?
RB – Como usei métodos estatísticos, sempre existe a chance de desvios. Contudo, dado o montante das despesas, tais desvios não mudarão o ponto fundamental das minhas conclusões.
O senhor acredita que, diante da possibilidade da criação desses Estados, pode haver interesses econômicos e políticos envolvidos, sobrepondo-se aos verdadeiros anseios do povo?
RB – Prefiro não responder.
Seus esforços técnicos partirão dessa vez para as questões fiscais. O quadro preocupante traçado em seus dados sobre o eventual fracionamento do Estado pode ser revertido ou ficar ainda pior?
RB – Acredito que a situação fiscal do remanescente Pará, caso o estado seja dividido, será preocupante, pois ele perderá receitas e não será capaz de cortar despesas na mesma proporção. Para compreender esse ponto, basta lembrar que os funcionários públicos estaduais não serão demitidos, é claro, e que os pensionistas não deixaram de ser pagos.
Supondo que a divisão seja aprovada, com os 17% de área restante e, portanto, com a diminuição de suas riquezas naturais, em potencial energético e hídrico, por exemplo, além de refração na produção animal e de sua área verde, o Pará correria o risco de inclusive sentir “moralmente” o golpe por virar a menor parte do bolo? Os que defendem a integridade afirmam que, pejorativamente, seria até chamado de "Parazinho"...
RB – Acho que mesmo que aconteça a divisão, o povo paraense não deveria se abater, pois a região remanescente continuaria ser a capital econômica e cultural da Amazônia.
Muito boa entrevista. Isto ajudará nós economistas pró-Pará a formar opiniões.
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