terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Impossível Fazer Previsões Precisas em economia


Compartilho a entrevista de Walter Friedman para a Revista Época (12/2013), na qual o autor destaca que em economia é impossível fazer previsões precisas. Trata-se de uma boa reflexão sobre a mania que a sociedade tem de querer que os economistas prevejam sempre o futuro.


Entrevista - Walter Friedman
Revista Época - 30/12/2013 - "É impossível fazer previsões precisas" - Josué Fucs

O historiador americano compara os economistas aos videntes e diz que muita gente se interessa por teorias malucas para tentar saber o que vem por aí.
O professor Walter Friedman, diretor do projeto de história dos negócios na Universidade Harvard, é, antes de mais nada, um provocador. Em seu novo livro, Fortune tellers (Videntes), lançado recentemente nos Estados Unidos, ele relata os primórdios da "indústria" de previsões econômicas. Compara os pioneiros da atividade e seus sucessores contemporâneos a videntes de todos os gêneros. Segundo Friedman, apesar de as previsões dos economistas não serem absolutamente precisas, elas nos ajudam a tomar decisões melhores, com base na lógica e na razão, não apenas em adivinhações. "O futuro nunca é previsível", afirma. "Isso não significa que deixaremos de tentar prever o que acontecerá."

ÉPOCA - Em seu novo livro, o senhor compara os economistas e analistas de mercado que fazem previsões econômicas aos videntes. Por quê? O que eles têm em comum?
Walter Friedman - Os videntes dão insights sobre os mistérios da vida. Os economistas fornecem insights sobre como a economia capitalista funciona, dão sentido a conceitos complexos. No final do século XIX e no início do século XX, período de que trato no livro, isso era algo reconfortante, especialmente nos Estados Unidos, onde se sucediam pânicos econômicos, que surgiam do nada. Esse pessoal ajudou a mostrar que o capitalismo não é um sistema totalmente caótico e que aquilo fazia parte de um ciclo que, de alguma forma, era previsível. Muitos dos pioneiros nas previsões econômicas adotaram o modelo usado na meteorologia. Usavam ciclos para comparar o mundo econômico ao mundo natural. Se o tempo vem em estações previsíveis, por que não poderia haver estações também na economia? Hoje, a ideia dos ciclos econômicos ainda é popular. Você vê isso o tempo todo na imprensa e em relatórios anuais das empresas. Embora não haja nada muito cíclico na economia, nos atemos à ideia de que as flutuações econômicas ocorrem em ciclos, não de forma mais ou menos imprevisível.

ÉPOCA - Em sua visão, as previsões econômicas podem ser consideradas como ciência ou não passam de bruxarias pouco confiáveis?
Friedman - Podemos dizer que elas são as duas coisas. São uma ciência, mas também exigem muita intuição. A história nos mostra que as previsões econômicas nunca são absolutamente precisas. Ao mesmo tempo, nos ajudam a tomar decisões melhores, com base na lógica e na razão, não apenas em adivinhações. Ao observar indicadores ou dados históricos, podemos ter uma ideia melhor de como as coisas mudaram ao longo do tempo. E uma forma melhor de fazer previsões do que levar em conta a posição das estrelas ou algum outro fenômeno do gênero.

ÉPOCA - É possível prever eventos econômicos? Prever o futuro da economia é diferente de outros tipos de futurologia?
Friedman - O futuro nunca é previsível. Isso não significa que deixaremos de tentar prever o que acontecerá. Só porque as previsões não são precisas, não significa que elas sejam uma perda de tempo. Em nosso esforço para prever o futuro, muitas coisas boas apareceram e se desenvolveram. O Escritório Nacional de Pesquisas Econômicas dos Estados Unidos, por exemplo, fundado em 1920, foi criado para medir os ciclos da economia e dos negócios, como parte do esforço para fazer previsões. O conceito de Produto Interno Bruto (PIB) também surgiu como forma de medir a evolução da atividade econômica ao longo do tempo. A econometria, que dominou o campo das previsões econômicas no final do século XX, desenvolveu-se a partir das previsões feitas pelo economista Irving Fisher (1867-1947), o primeiro a usar equações matemáticas para tentar entender como a economia funciona. Fazer previsões é uma grande atividade. Só que não podemos confiar totalmente no que elas dizem.

ÉPOCA - É por isso que os economistas erram tanto em suas previsões?
Friedman - A economia é muito complicada. Como disse há pouco, é impossível fazer previsões precisas. Você deve observar o que os economistas fazem quando cometem algum erro. A forma como agem quando erram uma previsão é um aspecto importante para saber se são honestos. Se admitirem o erro e explicarem por que ele aconteceu, é um bom sinal. Esses são os melhores a seguir.
Agora, se eles procurarem mostrar que estão sempre certos e que algum fator externo acabou afetando suas previsões, é um problema. Alguns economistas investem muito tempo fazendo marketing pessoal. Infelizmente, esses tendem a ser os mais bem-sucedidos, embora não tenham senso de humildade e fiquem fazendo campanha para si mesmos.

ÉPOCA - Quase ninguém consegue prever os momentos de ruptura, como as crises de 1929 e 2008. Por quê?
Friedman - Os mesmos modelos básicos sobrevivem às crises. Depois de grandes rupturas como as que você menciona, alguns se tornam mais preeminentes que outros. Até 1929, a ideia de que havia ciclos econômicos fixos, mensuráveis e previsíveis, predominava. Embora eles não fossem medidos a cada sete ou dez anos, as pessoas acreditavam que era um fenômeno mais ou menos previsível. Depois de 1929, esse modelo continuou, mas perdeu seguidores. Ganhou preeminência o modelo econométrico, segundo o qual é possível adotar políticas para influenciar os ciclos de negócios. As previsões econômicas passaram a se basear mais no efeito gerado pela política econômica. Depois da crise de 2008, aconteceu a mesma coisa. Os mesmos modelos continuaram a existir, alguns com mais preeminência, outros com menos, mas até agora não surgiu nenhum modelo novo.

ÉPOCA - Com tudo isso, devemos acreditar nas previsões econômicas?
Friedman - A economia capitalista é dependente de previsões. Não pode haver uma economia se você simplesmente acreditar que o futuro é caótico. Então, independentemente de ser confiáveis ou não, continuaremos a ter previsões. A pergunta é: que previsões são melhores para você tomar decisões? Isso tem a ver com o que você acha importante para a economia ou com o que pode mudar a economia e com todo tipo de considerações pessoais. A "indústria" de previsões será sempre um negócio próspero. Não dá para ter uma economia em que as pessoas criam inovações, fazem investimentos, abrem novas indústrias, se você simplesmente acreditar que o futuro é aleatório.

ÉPOCA - Em sua opinião, as ferramentas usadas pela indústria de previsões econômicas são mais confiáveis?
Friedman - Não diria que sejam mais confiáveis, mas são mais sofisticadas do que eram. Carregam muito mais conhecimento. No início do século XX, os pre-visores desenvolveram muitas das ferramentas usadas ainda hoje, incluindo a análise técnica do crescimento econômico, a análise fundamentalista, a econometria, o uso de indicadores econômicos. Tudo isso vem daquela época, embora fosse mais primitivo do que hoje. As premissas são as mesmas. A economia também é mais complicada hoje do que era.

ÉPOCA - Parece que as pessoas estão mais interessadas em ter uma ideia do futuro desenvolvimento de eventos econômicos, mas não se importam muito com as metodologias...
Friedman - É verdade. As pessoas querem acreditar que alguém entende como a economia funciona e tem uma boa ideia de para onde ela vai. Isso é bom e ruim. É bom porque leva as pessoas a se interessar pelo assunto e a fazer a própria pesquisa, em relação aos principais indicadores econômicos. Ao mesmo tempo, é ruim, porque algumas pessoas acabam se interessando por teorias malucas em razão dessa necessidade de ter alguém para lhe dizer o que vem por aí. Falo sobre isso no livro em relação a Roger Babson, empreendedor e economista americano (1875-1967). Muitas de suas teorias não faziam nenhum sentido. Ele as baseou nos trabalhos de Isaac Newton. Quando acertou suas previsões um par de vezes, muita gente passou a segui-lo. As pessoas não tinham interesse em saber o que estava por trás de suas previsões. Acreditavam apenas que, como ele tinha conseguido acertar, acertaria de novo. Esse é o perigo. Então, acredito que, se você pretende seguir previsões, precisa saber o que os economistas levam em conta para fazê-las. Você tem de entender os métodos usados para fazer as previsões.
 
"As pessoas querem acreditar que alguém sabe como a economia funciona e para onde ela vai"

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