A mensagem derradeira que quero deixar neste conjunto inicial de ensaios é relativa à nossa apatia como sociedade paraense a posição que está sendo delegada para a Amazônia em nosso pacto federativo. Hoje a Amazônia, e o estado do Pará como parte integrante de seu território, está relegada a um papel de mera fornecedora de insumos, matérias-primas e produtos com baixo valor agregado para a garantia do processo de acumulação do capital no centro-sul do Brasil ou em outras partes do mundo. O economista e amigo João Tertuliano Lins Neto em um de nossos debates no CORECON-PA expressou isto de forma muito clara ao afirmar que quando se pensa a Amazônia se pensa somente no fluxo out, o fluxo in é desconsiderado.
Continuamos sendo a periferia da periferia, ou uma periferia ativa como alguns assim nos chamam. Como se isto fosse um prêmio de consolação que amenizasse os nossos péssimos indicadores sociais. Continuamos sendo um estado com inúmeras riquezas naturais, elevadas potencialidades, mas com um povo pobre. Somos campeões em prostituição infantil, trabalho escravo, violência contra a mulher, violência no campo e uma série de outros indicadores que como paraense me envergonho. Sem falar que os nossos times de futebol que já não ganham mais nada. Até a nossa prata da casa, os nossos meninos prodígios, são exportados sem nenhuma compensação para os clubes regionais.
Neste contexto, alguns iluminados surgem com uma solução mágica. Vamos separar! Como se a situação atual do estado fosse decorrente apenas da incapacidade do Estado em gerir um território com dimensões enormes e não da posição que historicamente tem sido determinada ao Pará, como mera província de recursos naturais, de nosso modelo arcaico de fazer gestão pública e da irresponsabilidade administrativa de alguns. Mais uma vez uma pequena elite política e/ou econômica, muitos destes importados, coloca o seu projeto pessoal acima dos interesses de uma coletividade. Precisamos realmente reler o mestre Celso Furtado.
Muitas vezes me choco com a apatia com que determinados temas fundamentais são tratados aqui no estado. Ao lado desta apatia, há sem dúvida a falta de um claro e efetivo projeto de desenvolvimento para o estado do Pará capaz de unir a classe política, a elite econômica, os movimentos sociais e a sociedade em geral, e que permita com que os nossos interesses possam ser honradamente defendidos. A forma como Belo Monte nos foi empurrada goela a baixo praticamente sem resistência é um exemplo. Grande parte dos condicionantes prévios ainda não foram atendidos e a “ilógica lógica” de cobrança do ICMS de energia no destino continuará, para tristeza de quem aqui fica. Ficaremos mais uma vez com significativos impactos sociais e ambientais do empreendimento sem uma devida compensação financeira que permita que políticas públicas pró-ativas e adequadas possam ser implementadas. Ao lado disto, continuamos sendo lesados com as perdas da Lei Kandir e com o não repasse das compensações financeiras que teoricamente o Pará tem direito.
A nossa região está sendo tratada como um simples almoxarifado. Daqui tudo se tira e muito pouco é deixado a título de compensação. Um conjunto de rock regional, Mosaico de Ravena, na música Belém, Pará, Brasil, expressou muito bem este sentimento de abandono. Aqui transcrevo apenas um refrão da música que vale ser ouvida por inteira: “A culpa é da mentalidade criada sobre a região. Por que é que tanta gente teme? Norte não é com M. Nossos índios não comem ninguém. Agora é só hambúrguer. Por que ninguém nos leva a sério? Só o nosso minério.”
Por que digo isto neste ensaio? Por que se cabe a uma categoria profissional ter uma visão clara deste processo, este profissional é o economista, que é ensinado a ter uma visão holística e crítica de mundo. O economista paraense não pode ficar calado em relação a este novo processo de colonização que está nos sendo imposto. Qual é o projeto de Brasil que temos para a Amazônia? Aliás, temos algum projeto de nação?
No último Encontro de Economistas da Amazônia (ENAM) realizado na Cidade de Manaus fiz alusão a uma obra clássica de Armando Dias Mendes, A Invenção da Amazônia. Se em algum momento a Amazônia como nós hoje a conhecemos foi inventada, e o foi, principalmente através de políticas e ações coordenadas pelo Governo Federal, hoje a Amazônia precisa ser reinventada e nós economistas precisamos exercitar o nosso espírito criativo neste momento. Como nos ensinou Celso Furtado, o planejamento do desenvolvimento envolve criatividade e inventividade. Mais do que nunca a sociedade paraense precisa do economista!
Acredito que este problema possui várias causas, porém dentre elas destaco aqui o baixíssimo nível educacional da população em geral.
ResponderExcluirSem um mínimo de conhecimento, não é possível que a sociedade paraense abra seus olhos para todos esses abusos cometidos contra a economia do nosso estado, como por exemplo a Lei Kandir.
Como economistas (no futuro eu serei também), temos o dever de conscientizar sobre temas de interesse público, como a Divisão Territorial do Pará e outros tantos. Como uma certa vez eu ouvi um homem sábio falar: Está na hora do economista sair de seu casulo!
Reverter esse quadro não será fácil e exigirá um dispendio muito grande de tempo e trabalho. E embora seja uma meta ousada mudar a mentalidade de uma população, precisamos tentar.
Termino esse comentário com um trecho que me chamou muita atençao do mestre Celso Furtado em A Pré-Revolução Brasileira, que em minha opnião está completamente relacionado com a minha argumentação.
"Poucos de nós temos consciência do caráter profundamente anti-humano do subdesenvolvimento. Quando compreendemos isto, facilmente explicamos por que as massas estão dispostas a tudo fazer para superá-lo."