terça-feira, 6 de novembro de 2012

Artigo: Uma ciência, muitas aplicações


Por Luiz Alberto Machado (*)

“Meus estudantes vão prestar mais atenção 
às minhas aulas a partir de agora.”
Alvin Roth

Venho acompanhando, há anos, a redução da procura pelas vagas oferecidas pelos cursos de Economia no Brasil, fenômeno que, aliás, aconteceu anteriormente também nos Estados Unidos e em diversos países da Europa.
Já li e ouvi as mais diferentes explicações para este fenômeno que vão da dificuldade do curso em comparação a outros cursos universitários, passam pelo seu viés excessivamente teórico e macroeconômico, e chegam à baixa empregabilidade que o curso oferece a quem se forma em Ciências Econômicas.
Não considero convincentes quaisquer dessas explicações, embora reconheça que o curso apresenta um grau de dificuldade superior ao de outros cursos de áreas limítrofes, como o de Administração, por exemplo.
Sustento minha posição na extraordinária abrangência oferecida pelo curso de Economia, o que é válido tanto no plano da teoria como no da aplicação prática.
A concessão do Prêmio Nobel de 2012, divulgada no dia 15 de outubro, aos norte-americanos Lloyd Shapley, da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), e Alvin Roth, de Harvard, é apenas mais um reforço ao meu ponto de vista. Suas contribuições no que se convenciona chamar de “teoria da combinação”, uma ramificação da “teoria dos jogos”, permite a utilização de modelos teóricos para associar, com a maior eficiência possível, pares ou grupos de agentes em situações em que há uma falha de mercado, ou, para usar o jargão econômico, “situações em que o mercado não teria um ponto de equilíbrio, onde a oferta e a demanda se cruzam”. Entre os vários exemplos de aplicação desse modelo teórico podem ser citados a escolha mais adequada entre doadores e recebedores de órgãos, a dos homens e mulheres mais indicados para se casarem ou a alocação mais eficiente de estudantes em escolas e hospitais, no caso de residência médica.
Não é qualquer ciência que permite uma aplicação tão ampla de seus modelos teóricos, o que só é possível pela rígida e abrangente formação do economista, que combina teoria econômica, métodos quantitativos e formação histórica.
Shapley e Roth não são pioneiros nesse sentido, pois seguem uma tradição que inclui nomes como, por exemplo, o de Gary Becker, da Universidade de Chicago. Becker, reconhecido como um dos principais especialistas na teoria do capital humano, aplicou modelos econômicos baseados na problemática neoclássica (fundamentada na racionalidade dos indivíduos) para explicar como os agentes econômicos tomam decisões nos mais distintos aspectos. Segundo Becker, para se casar, para se dedicar ao crime, para consumir drogas, para ter filhos, para comprar um eletrodoméstico ou para se divorciar, o indivíduo toma sua decisão comparando racionalmente os custos e os benefícios, tendo em mente a maximização de sua satisfação.
Mais recentemente, Steven Levitt tornou-se mundialmente conhecido por ter escrito, em parceria com Stephen Dubner, o best seller Freakonomics, no qual também utiliza ferramental teórico da economia, da estatística e da econometria – que é uma espécie de soma das duas primeiras – para chegar a conclusões surpreendentes e raras vezes relacionáveis a respeito de temas aparentemente tão distantes como redução da criminalidade e legalização do aborto, trapaças envolvendo professores de ensino médio nos Estados Unidos ou lutadores de sumô no Japão.
A mesma amplitude observada no plano teórico pode ser observada no plano real, quando se observa o mercado de trabalho e a enorme gama de ocupações que podem ser desempenhadas pelos economistas.
No Simpósio Nacional dos Conselhos de Economia (SINCE), realizado em Belo Horizonte em setembro último, o Prof. Roberto Macedo, utilizando-se de dados que vêm sendo constantemente atualizados, chamou atenção para uma tendência verificada recentemente no mercado de trabalho, representada pelo crescente descolamento entre profissão e ocupação. Tal descolamento é maior em algumas profissões do que em outras, estando a de economista entre as que apresentam maior grau de dispersão, o que indica que o mesmo pode atuar em um número significativo de ocupações, como se vê na tabela 1, conferindo-lhe um elevadíssimo grau de empregabilidade.

Dispersão Ocupacional
Nº de ocupações que alcançam mais de 70% dos trabalhadores, por profissão – 2010
Curso/Profissão
Número
Curso/Profissão
Número
Odontologia
1
Engenharia Civil
12
Medicina
2
Matemática
13
Farmácia
2
Agronomia
13
Biologia
3
Biblioteconomia
14
Enfermagem
3
Física
17
Artes
4
Contabilidade
21
História
4
Teologia
23
Serviço Social
6
Engenharia Mecânica
25
Sociologia
6
Química
25
Filosofia
7
Engenharia Química
26
Arquitetura
8
Estatística
27
Veterinária
8
Economia
33
Psicologia
10
Administração
35
Direito
11
Engenharia Elétrica
37


Diante dos argumentos aqui apresentados, recomendo aos jovens que estão em fase de decisão do curso universitário que irão fazer para considerarem com mais carinho a opção pela Economia. Seguramente terão que se esforçar bastante ao longo de todo o curso, mas, desde que escolham uma boa faculdade e tenham um bom aproveitamento, serão amplamente recompensados na carreira profissional, seja ela mais voltada para o plano teórico, como pesquisadores e/ou professores, seja ela mais voltada para o chamado setor real da economia, atuando em empresas públicas ou privadas, tanto na macro como na microeconomia.

Iscas para ir mais fundo no assunto

Referências e indicações bibliográficas
BECKER, Gary. Teoría económica. Traducción de Ana Catalina Mayoral. México: Fondo de Cultura Econômica, 1987.
______________ Educação é o melhor investimento. Entrevista. Think Tank, Ano III, Número 9, Dezembro de 1999, pp. 13 – 16.
BECKER, Gary S. e BECKER, Guity N. The economics of life: from baseball to affirmative action to immigration. Chicago: McGraw-Hill Trade, 1998.
CHACRA, Gustavo. Americanos dividem Nobel de Economia. O Estado de S. Paulo, 16 de outubro de 2012, p. B 6.
LEVITT, Steven D. e DUBNER, Stephen J. Freakonomics: o lado oculto e inesperado de tudo que nos afeta. Tradução de Regina Lyra. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 2007.
MACEDO. Roberto. Seu diploma, sua prancha. São Paulo: Saraiva, 1998.
MACHADO, Luiz Alberto. Como enfrentar os desafios da carreira profissional: antes e após sua escolha. São Paulo: Trevisan Editora, 2012.
Referências e indicações webgráficas
MACHADO, Luiz Alberto. Grandes Economistas: Gary Becker e as diferentes aplicações de métodos econômicos. Disponível em http://www.cofecon.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1080&Itemid=114.
SEIBT, Taís. Entenda como o Nobel de Economia ajudou a melhorar o sistema de transplantes de rins nos EUA. Disponível em http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/bem-estar/noticia/2012/10/entenda-como-o-nobel-de-economia-ajudou-a-melhorar-o-sistema-de-transplantes-de-rins-nos-eua-3919439.html. 
TEORIA da combinação rende Nobel. Diário do Comércio, 16 de outubro de 2012, p. 2. Disponível em http://www.dcomercio.com.br/index.php/economia/sub-menu-economia/97833-teoria-da-combinacao-rende-nobel.
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(*) Economista, conselheiro federal, professor da Fundação Armando Álvares Penteado

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