terça-feira, 21 de junho de 2011

Reflexões sobre a profissão de economista - Parte 3 - A grande lição de um mestre, Celso Furtado

O maior desafio da profissão do economista, sem quere adiantar cenas de atos posteriores, é fazer com que o economista volte a ser o mordomo da sociedade. Precisamos pensar a coisa pública e deixar de lado o vírus do individualismo metodológico que muitos contraem ao ler Adam Smith. A Fábula das Abelhas de Bernard de Mandeville funciona apenas na colméia, os vícios privados são, em última instância, apenas vícios privados! Afinal, alguém já viu a mão invisível do Mister Smith? Ah, ela está no modelo Novo Clássico mais recente, você não viu? Presta atenção, está ao lado do unicórnio, perto da Matita Pereira e do Mapiguari! É isto mesmo, brincadeiras a parte, uma figura de ficção tem de estar perto de seus pares, nos livros de folclore.
Deixando para lá o folclore popular, Celso Furtado nos legou uma grande e inesquecível lição, a de que o subdesenvolvimento de uma sociedade acaba sendo sempre a expressão de um insuficiente nível de racionalidade pública e social. Desta forma, a sua superação somente pode ser concebida no quadro de um projeto político capaz de subordinar os interesses individuais aos interesses coletivos buscados a médio e longo prazo através do planejamento do desenvolvimento. Implica, portanto, na tentativa de encontrar resposta a múltiplas questões. Mas acima de tudo, na manipulação correta da mão visível do Estado. Ah, esta sim nos vemos a todo o momento!
Trocando em miúdos, qualquer tentativa de superação do subdesenvolvimento deve estar assentada num projeto político, fundado em percuciente conhecimento da realidade e esposado por amplos segmentos sociais, que aumente o poder regulador das atividades econômicas, única forma de colocá-las a serviço da satisfação das necessidades sociais legitimamente conhecidas, e capaz de romper com o quadro de dependência estrutural de uma economia periférica. Nesta construção, qualquer concepção de desenvolvimento não pode alienar-se de sua estrutura social, e nem tampouco a formulação de uma estratégia desenvolvimentista pode ser concebida sem preparação ideológica e participação popular. Este processo deve estar ancorado à idéia de um projeto que recupere o mercado interno como centro dinâmico da economia, reforme as estruturas anacrônicas que pesam sobre a sociedade e comprometem sua estabilidade, e resista às forças que operam no sentido da desarticulação do sistema econômico regional e nacional, e que, portanto, ameaçam a unidade federativa.
Isto pressupõe o exercício de uma vontade política socialmente respaldada e num projeto político-social tendo em vista sempre que o desenvolvimento econômico precisa ser entendido como um processo dinâmico que transcende aspectos de natureza puramente econômica, alcançando toda a estrutura de organização da sociedade, comportando sempre elementos de intervenção e invenção. É um processo autônomo, sustentado e civilizador, baseado no progresso tecnológico e manifesto numa estrutura de sociedade mais adiantada, englobando aspectos culturais, institucionais, sociais e econômicos, que alargam os horizontes de possibilidades dos agentes e que conduzem a acumulação capitalista à criação de valores, bens e serviços que se difundem mais homogeneamente pela coletividade e que preserve o meio-ambiente para gerações futuras. Em última instância, implica na ampliação da liberdade em todas as esferas da vida e da sociedade. Neste sentido, na sua morfogênese, o desenvolvimento necessita desobstruir as forças que tencionam pela manutenção das estruturas tradicionais de dominação e reprodução do poder, requerendo, portanto, ser implantado e coordenado por uma unidade dominante possuidora de poder, força e coação. Possui inerentemente dois aspectos peculiares: um mais atraente próprio de um processo de arranjo, montagem, dar sentido, direção, coerência as transformações que uma sociedade quer armar e projetar para o futuro, dispondo de certos instrumentos eleitos para determinados fins; e aquele menos atraente, próprio dos processos de se desmontar, desarranjar, importunar, constranger, frustrar expectativas e ações deletérias à construção social.
Bem, este assunto é polêmico. Certamente incomoda muita gente. Quem sabe a retrógrada elite econômica e política? Mas se podemos tirar uma lição fica a necessidade de resgatarmos o conceito pleno de Economia Política e o papel principal do economista em uma sociedade. Qual? O papel de mordomo da sociedade, afinal este “ornitorrinco” é o principal agente de transformação social, posto ser o profissional capaz de apontar rumos e trajetórias e um caminho verdadeiramente sustentável para a superação da condição de periferia.

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